André Soares em Viana do Castelo

Por Eduardo Pires de Oliveira

Na última conversa ao telemóvel com o Eduardo Pires de Oliveira estava a ler o livro André Soares em Viana do Castelo, que repousava, com os óculos, na cama. Sugeriu-me que tirasse uma fotografia

A repetição faz parte da poesia, da música e da rotina. Assim como da imagem e da decoração. Nada, portanto, como copiar e colar:

“Segundo Marshall McLuhan (A Aldeia Global, 1992), o cérebro divide-se em dois hemisférios: o esquerdo, visual, mais racional, e o direito, acústico, mais emocional. Na Modernidade, prevalece o lado esquerdo” (https://tendimag.com/2023/07/30/barbas-salutares/).

McLuhan também se aventura na seriação da história da humanidade em três idades em função do meio/ambiente de comunicação preponderante: oralidade, impresso e eletrónica. Entre a oralidade e o impresso, intercala-se ainda o manuscrito (sobre as consequências da passagem da oralidade para a escrita, ver Jack Goody, The Domestication of the Savage Mind, 1977). Com a invenção da imprensa e o advento da “galáxia Gutenberg”, o “homem tipográfico” tende a afastar-se da mundividência, caraterística da oralidade, do tribal, do global, do mosaico, da miscelânea, da irregularidade, do paradoxo, do multicentrado, em suma, de um espaço “cujo centro está em toda a parte e a circunferência em parte nenhuma” (Pascal, Blaise, Pensamentos, 1670. Artigo XVII). Passa a inscrever-se num espaço clássico, geométrico, ordenado e sequencial, alvo de uma abordagem individualizada, abstrata, especializada, hierarquizada, objetiva, focada, linear, analítica e classificatória. Com os novos meios de comunicação, tais como a rádio e a televisão, começa uma nova idade, a “galáxia Marconi”, em que prevalece o audiovisual. Neste novo ambiente ressurgem propensões e formas que lembram a idade da oralidade, principalmente o “homem tribal” da “aldeia global” (Marshall McLuhan, The Gutenberg Galaxy: The Making of Typographic Man, 1962).

De acústico e visual, de eletrónico e tipográfico, de tribal e individual, todos temos um pouco. Cada qual a seu jeito. Quer-me parecer que o Eduardo Pires de Oliveira consegue alterná-los, oscilando entre ambos os registos. Nas conversas e nas visitas guiadas emociona-se, dispersa-se, idealiza e opina. Entusiasma-se e entusiasma. Em contrapartida, quando produz um texto de teor científico cinge-se a descrever, classificar e contextualizar sem se dispersar. Disciplina-se e disciplina. A voz do coração e a letra da razão, o amor à arte e o rigor da ciência, lado a lado.

Igreja de São Domingos. Retábulo de Nossa Senhora do Rosário. Fotografia de Adelino Pinheiro da Silva

Eduardo Pires de Oliveira acaba de publicar um livro dedicado a André Soares em Viana do Castelo. Incide sobre os retábulos da Igreja de São Domingos, da Igreja da Senhora da Agonia e da Capela das Malheiras. Pelo caminho, apresenta “o mais importante artista português do tardobarroco e do rococó (…) sem par quer em Portugal, quer na Europa do seu tempo”. Dá-nos a conhecer, de forma detalhada, aprofundada e circunstanciada, a “obra do mestre” através do olhar de um especialista, sem derivas nem fabulações. A “voz do coração” e da paixão pela arte ficam à porta, resumindo-se à nota introdutória (“O porquê deste livro”) ou aguardam pela saída, despedindo-se no “Encerramento”. Quando muito, insinua-se algum incómodo perante a atribuição demasiado apressada, e provavelmente falsa, do desenho da capela das Malheiras a André Soares. Não sendo, efetivamente, da autoria de André Soares, pode estranhar-se que lhe seja dedicado um capítulo inteiro. Na verdade, a caraterização da capela torna-se imprescindível à demonstração da nova interpretação proposta. Acresce que André Soares não está apenas presente na materialidade dos retábulos mas também na mente, ajustada ou equivocada, das pessoas, nomeadamente dos “entendidos”. Nesta perspetiva, a parcimónia do título do livro não deixa margens para dúvidas: André Soares em Viana do Castelo, nem mais, nem menos. Para além da obra, abrange a figura.

Igreja da Senhora da Agonia. Retábulo-mor. Fotografia de Adelino Pinheiro da Silva

Está prevista uma visita guiada às obras de André Soares na cidade de Viana do Castelo no sábado dia 16 de setembro. Começará às 14:30 na Igreja da Senhora da Agonia, passará pela Igreja de São Domingos e terminará na Capela das Malheiras, onde será promovido um novo lançamento do livro. Será uma oportunidade para surpreender a outra face do Eduardo Pires de Oliveira, mais pródiga, veemente, interativa e envolvente.

Segue um pdf com excertos do livro André Soares em Viana do Castelo, nomeadamente a capa, a ficha técnica, a nota introdutória “O porquê deste livro”, o capítulo 1 sobre o André Soares, o capítulo 4 dedicado à Capela das Malheiras, uma seleção de imagens, o “Encerramento” e o Índice.

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  1. Melancolias | Tendências do imaginário - Agosto 10, 2023

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