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As novas sereias. Encantos de espantar

Numa atmosfera eivada de exotismo e exuberância, os sentidos almofadados entregam-se ao ecrã das surpresas programadas (Albertino Gonçalves, instalação “cápsulas de emoções”, exposição Vertigens do Barroco, Mosteiro de Tibães, 2007)

Estiveram abertas até ao dia 10 de março as candidaturas para o concurso New York Festivals Advertising Awards, organizado em parceria com a BCW (Burson Cohn & Wolfe, empresa multinacional de relações públicas e comunicação, com sede em Nova York). A “chamada” desafia os candidatos a exibir algo nunca antes visto (“Show Us Something We Haven’t Seen”), capaz de impressionar e contrariar a saturação dos nova-iorquinos e dos profissionais de publicidade. Algo, ao mesmo tempo, espantoso e memorável.

“A New York Festivals (NYF) desenvolve, desde 1957, a nível mundial, uma atividade que convoca o espírito de rutura e de vanguarda caraterístico da cidade (…) A campanha de promoção reúne fotógrafos da cidade de Nova York cujas imagens expressam a vibração urbana de NYC e projetam uma luz reveladora da agitação e da atitude invulgares que alicerçam a excelência criativa em NYC” (Scott Rose, presidente, New York Festivals Competitions).

A campanha de promoção do festival é composta por três posters e um vídeo.

Anunciante: New York Festivals Advertising Awards. Título: Show us something we haven’t seen. Agência: BCW (Burson Cohn & Wolfe). Direção: Henry DaCosta. USA, fevereiro 2023

“Como nunca ninguém viu” é o título de um artigo que publiquei em 2011 (in Moisés de Lemos Martins et alii, Imagem e Pensamento, Coimbra, Grácio Ed., pp. 139-165). Corresponde à conferência “A construção do impossível: o espaço nos anúncios publicitários”, apresentada no Congresso Internacional de Ciências da Comunicação, em Braga, em setembro de 2009.

 “‘Ver como ninguém viu’, porventura mais do que ver “o nunca visto”, eis a tentação ou, melhor, a proposta que percorre a publicidade atual” (Como nunca ninguém viu, p. 142).

O texto procura argumentar e ilustrar esta intuição. O vídeo “A construção do impossível”, com duração de 20 minutos, acrescenta uma seleção de anúncios ilustrativos. Segue uma primeira versão do texto, não paginada mas com imagens a cores (a versão editada, com imagens a preto e branco, está acessível no seguinte endereço do livro: https://hdl.handle.net/1822/29165), bem como o vídeo complementar. Constam entre os meus trabalhos preferidos, concebidos, aliás, durante um período de deriva da desmotivação da cidade académica para a exploração de trilhos menos consagrados. Menos pontos no currículo e mais realização pessoal. A criação do blogue Tendências do Imaginário, em 2011, constitui um marco e um bom exemplo.

A aposta no assombro, especialmente no nunca visto, cruza-se com duas tendências que atravessam a publicidade. A difícil captação da atenção e influência dos públicos justifica duas rotações: dos produtos para as marcas e do desejo para a adesão. À distinção invejável sobrepõem-se a identificação projetada e a estranheza fácil de entranhar. O foco desliza, assim, por exemplo, do belo e do funcional para o surpreendente e o insólito, que tocam, impregnam e envolvem. Uma espécie de rotinização ou homeopatia do anómalo.

Albertino Gonçalves. A Construção do Impossível. Conferência no Congresso Internacional de Ciências da Comunicação (Braga, setembro 2009)

Grandville: Disfarces e Metamorfoses

O inverno vai rigoroso. Nem sequer o blog Margens escapa aos rigores do frio. Congeladas as sementes, não brotam rebentos. Resta re-colher flores secas adormecidas em vasos pretéritos. Para eludir a falha e iludir a vista.

01. J. J. Grandville, Une promenade dans le ciel. Le Magasin pittoresque. 1847.

J. J. Grandville, Une promenade dans le ciel. Le Magasin pittoresque. 1847.

Jean-Jacques Grandville (1803-1847) é um ilustrador e caricaturista francês da primeira metade do século XIX. Adquiriu fama com as suas metamorfoses envolvendo homens, animais, vegetais e objectos.

11. J.J. Grandeville. Jongleur des univers. J. J. Grandville, O Malabarista de Planetas. Un autre monde. 1844

Conhecido como o “avô do surrealismo”, Grandville convoca o maneirismo, nomeadamente Giovanni Battista Braccelli e Lorenz Stoer (ver figuras 07 e 12). Algumas gravuras antecipam M.C. Escher (ver figuras 1, 7, 8, 9 e 19). Os Queen recorreram aos desenhos de Grandville para as capas do álbum Innuendo (1991) e respectivos singles (figuras 11 a 14.1).

11.1. Queen. Innuendo.

11.1. Queen. Innuendo.

Exceptuando as figuras 1 e 10, ambas de 1847, todas as imagens deste artigo foram extraídas directamente do livro Un Autre Monde, publicado em 1844. Grandville ilustrou vários livros, tais como as Fábulas, de La Fontaine, o Don Quixote, de Cervantes, as Viagens de Gulliver, de Swift, ou Robinson Crusoe, de Daniel Defoe.

Segue a música Innuendo, dos Queen (1991) e uma galeria com imagens de Grandville e do álbum Innuendo, dos Queen.

Queen. Innuendo. Innuendo. 1991

Galeria de imagens: J.J. Grandville e Innuendo dos Queen: