Albert Camus: sinónimo de liberdade

Daniel Noversa

Albert Camus (1913-1960)

No meio desta algazarra, o escritor já não pode estar à espera de se manter afastado para prosseguir com as reflexões e imagens que lhe são caras. Até à data, mal ou bem, a abstenção foi sempre uma possibilidade na história. (…). A partir do momento em que a própria abstenção é considerada uma escolha, punida ou louvada como tal, o artista, quer queira quer não, está envolvido. Envolvido, parece-me neste caso um termo mais adequado do que comprometido. (…) / Criar, hoje em dia, significa criar perigosamente.
Albert Camus (1937-1958/2022, p. 260-262)

Faz hoje 63 anos. A 4 de Janeiro de 1960, morreria Albert Camus, homem do existencialismo francês, num trágico e inesperado acidente de viação, perto de Sens. Homem de causas e apaixonado pela vida e pela Arte. Um homem que viveu em liberdade e combateu pela liberdade dos outros. Por ter vivido perto, jamais será esquecido por todos aqueles que o admiram. Para esses, a sua obra aparece como uma agradável visita. É a pedra de toque a que voltamos sempre, para reaver riquezas de um pensamento lúcido e profundo e de grande elevação literária.

No seu discurso na entrega do Prémio Nobel da Literatura, em Estocolmo, a 10 de Dezembro de 1957, Camus advoga que os artistas não devem estar só comprometidos, mas também envolvidos com as tarefas difíceis da sua época.

Segundo ele, os artistas deveriam procurar compreendê-la invés de julgá-la. Dar armas em invés de lições. Estar, portanto, ao serviço dos que fazem a história. Mas ao lado daqueles que sofrem e são oprimidos. Camus acreditava que só em liberdade seriamos melhores e que a esperança residia nos artistas, por esses “milhões de solitários cujas acções e obras, dia a dia, negam as fronteiras e as mais vulgares ilusões da história, para fazer brilhar fugazmente a verdade sempre ameaçada que, sobre as suas dores e alegrias, cada um cria por si e para todos” (Camus, 1937-1958/2022, p. 279), recuperando-a, suscitando-a e reanimando-a no devir perpétuo da história.

A vocação dos artistas consistiria, na sua opinião, em combater a mentira e a servidão, resistindo e recusando a opressão, enfim, revoltar-se. Nas suas palavras, “a arte não é um prazer solitário. É um meio para comover o maior número possível de pessoas, oferecendo-lhes uma imagem privilegiada dos sofrimentos e alegrias comuns. Obriga, portanto, o artista a não se isolar; submete-o à verdade mais humilde e mais universal. (…) O artista forja-se nesse contínuo ir e vir entre si e os outros, a meio caminho entre a beleza sem a qual não pode passar e a comunidade da qual não se pode desligar. Razão pela qual os verdadeiros artistas não desprezam nada; obrigam-se a compreender em vez de julgar” (Camus, 1937-1958/2022, p. 256).

A liberdade consiste em poder escolher as suas cadeias, mas cada cadeia que se abre é um novo espaço de liberdade que se conquista. (Albertino Gonçalves)

Camus, A. (2022). Conferências e Discursos. Livros do Brasil.

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